domingo, 17 de abril de 2011

The long and winding road

Ela permaneceu em silêncio. Aquele silêncio que machuca, que faz segundos durarem anos no negro da noite.
Foi aí que tudo veio a tona: seu vestido roxo, seus passos apressados em frente a livraria. E a primeira vez que trocaram olhares em frente ao cinema. Aquelas sardas.
Mas sua solidão cinza nos últimos tempos também a assolaram - e são estas que afirmaram sua escolha.
E ela não merecia. Não merecia aquelas meias-palavras, meios-olhares, meia-presença...e fins-de-semana vazios, loucos para serem preenchidos.Tudo porque se entregou por inteiro, olha que ironia...e sua alma estava ficando desgastada, desbotada.
Mas ontem um buquê correu à sua presença. Amarelo, feliz, vindo de uma noiva radiante vestida de sol.
E se "para encontrar a felicidade, a dor é inevitável", como lhe disseram,
com certeza ela precisa se apaixonar de novo... só que por ela mesmo.

domingo, 3 de abril de 2011

Carta a um amigo distante.

Você se foi há tantos anos. E eu fiquei aqui.
Me sinto solitária as vezes, e lembro de você... penso que depois desse tempo todo, sua vida por ai deve ter mudado.
Mas pai, não se esqueça de mim. Eu jamais esqueci de ti.
Como me pediu, não deixei de fazer o nosso presépio no Natal, mas tive que dar uma pintada no Baltazar - não pega bem pra um rei mago ficar descascando.

Olha, nem é novidade, mas sabia que consegui me formar? Bem, meu padrinho que foi pra aí deve ter te contato que dançou comigo a valsa dos pais. As minhas avós estão bem?

Sabe, quando criei um cenário para uma banda, eu chorava, pensando que você ia ter orgulho de mim, ia dar aquele seu sorriso de satisfação na platéia.

Mas o que eu precisava te contar era sobre uma viagem. Menino do céu, conheci Londres! Sei que você daí vai esnobar e dizer que tem uma visão bem melhor da que eu tive da London Eye, mas olha, era a cidade que a gente tanto queria ir... Você nem deve lembrar, mas ainda tenho a borrachinha que me deu aos 12 anos com a bandeira do Reino Unido. Não ria da próxima expressão, mas "morra de inveja": fui pra Liverpool e tive a impressão que estava contigo na Magical Mystery Tour - O banco do meu lado, ficou reservado pra você. E, o mais estranho, é que pegando o trem tinha a esperança de te encontrar mesmo naquela cidade em alguma esquina, fazendo uma daquelas suas dancinhas desengonçadas. Ah, mas se tava eu não vi! Lá viajei pra um lugar diferente, cheio de lembranças boas suas - mesmo sem a gente nunca ter ido antes.

Ai pai, eu falhei muitas vezes também... falhei comigo também, sabe? E deixei que não me tratassem bem. Queria tanto que você pudesse me ouvir... você dizia que eu era você de saia: acho que iria me entender. Aliás, aqui entre nós, você não quer dar um susto em algumas pessoas pra mim não? Há, é brincadeira viu? Se te conheço, já achou a idéia plausível.

Ontem, olhando velhos maleiros, achei sua coleção quase inteira do "O Pato Donald", dos anos 50 - aquela que você me deu aos 9 anos. Chorei mais uma vez, ao tentar catalogar tudo. E sabe duma coisa? Sabe aquela empresa que você ia desenhar quadrinhos, e que só não foi porque ia casar com a mãe e precisava ganhar melhor? Então, eu trabalho lá... e potz, como sou teimosa, viu?

Pai, apesar de não estar aqui, você é quem posso contar. Não me abandona não... é sua lembrança que me dá forças para tentar alcançar meus sonhos, por mais difíceis que eles possam parecer.

Escrever essa carta pra você me fez lembrar quem sou, meus valores e meus projetos. Quando eu for pra aí, espero te contar muito mais.

ps: O que eu faço com a sua gaita escocesa hein?